sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

(em frente à Maternidade Alfredo da Costa)

Naquela longa espera, arrancava com o carro caso soubesse guiar. Mas iria para onde?
Deixava-se estar à espera, o melhor é estar quieto.
Tudo o deixava quieto. Inquieto.

Movia-se, decidido a mudar o que o apoquentava.
Movia-se, decidido a mudar o
Mundo.

Andava,
numa romaria transcendental,
numa concha,
num

minuto.
Andava?
Movia-se decidido a mudar o
Mundo.
Por isso esperava.
Esperava.

sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Rua Carvalho Araújo.
Largo Medina qualquer coisa.
Prédio azul com varanda.

Meninas novas
descem.
Velhas seguem
atrás.

Um homem come um pão.
Pombos.
Segways.

Rapazes novos a subir.
3 senhoras a falar.
Skate.

Cabos eletricos cruzam os céus de Lisboa.
Antenas parabólicas.
Monovolumes.
Pessoas.

Tinhas as floreiras nos olhos quando olhavas minhas janelas. Ao abrir as portadas lá estavas tu com o Sol a bater-te na cara.

Amei-te.





sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Havia uma pensão que queria ser mais do que isso. Então, cercaram com grades parte do relvado do Jardim Alfredo Keil e anunciaram por decreto a implantação de um quiosque modelo “Império”. Soube daquilo assim: Venho rua acima e vejo escrito nas grades do Jardim: “A Fabrigimno vai aqui erguer um Quiosque modelo Império”. Mas não era bem assim… li mal e… confundi-me! O que dizia mesmo era “Quiosque modelo República”. Engano compreensível, eu sei. A memória é o que define a espécie humana e a memória deste individuo já não é a mesma de antigamente. Vinha ofegante a subir a rua e quando chego a casa, ao invés de Republica escrevo Império. Pior! À pressa, escrevo um chorrilho de disparates sobre tudo isto. Armado em senhor da Razão, pareço o Velho do Restelo do bairro da Glória, sempre pronto a falar mal desta nova vaga de progresso, como se uma coisa não fosse apenas uma coisa, como se fossem coisas diferentes. Engano compreensível, eu sei. Ou não! É que desconhecendo o sabor do doce, uma pessoa ainda pensa que é uma coisa má… É como naquela história do Adão e da Eva, uma história de amor e traição, pecado e castigo. Recapitulemos: a Eva come a maçã! O Adão come a maçã. A serpente ri-se. O Senhor fica chateado. Expulsam-se os comilões do Jardim.
Nasceu um cogumelo na Praça da Alegria. Protegido pelo seu muro de metal, nasceu e cresceu, expandindo-se pelo território. Há uns tempos havia-me deparado com um rececionista gordo escorregando baba para cima das empregadas de limpeza com suas fardas verdes salazarentas e ares de superioridade, julgando-me a mim. Ora, detentor da Razão era eu… quer dizer… ok…pronto… nascem cogumelos no Jardim! Cogumelos e trevos. Expulsam-se os mandriões do jardim comem uma maçã e acham que já sabem qualquer coisa (onde é que isto já se viu!  Ainda querem dinheiro e ordenados, qualquer dia até descanso pedem! Sem gente trabalhadora  a relva cresce, já se sabe… trevo e cogumelos por todo o lado! O Modelo Império… (ai desculpem!) República é uma coisa nossa para usufruto de só alguns. Mordida a maçã, há que fazer pela vida… ou queriam passar o resto da vida refastelados a olhar para as estrelas, tempo ameno o ano todo, os passarinhos a cantar e tal e tal e tal. E a relva como ficava? Era ver o verde engolir o Éden. E olhem que não falo do antigo Hotel nos Restauradores… ou… será…? Confusão banal? Erro ordinário?
O cogumelo cresce e alivia-nos do desconforto da vida, apodera-se dela, dá-nos uma bela esplanada. A paisagem não sai nada cara! Café a 65 cêntimos. Há que angariar clientela, sobreviver ao Inverno, há que alimentar o cogumelo!
Nascem cogumelos por todo o lado.
A pensão alastra o seu território, conquistando terreno ao espaço privado. A República (agora não me enganei) cede o seu espaço. A Pensão agora é Hotel! Comprou o seu novo titulo no mercado nobiliário.
Afinal a paisagem sai um bocado cara. Há que comprar títulos, propriedades, licenciamentos etc. O progresso não é barato!
O Império progride. Claro! Sentado na esplanada (a Liberdade ali ao lado) o Imperador pensa no seu plano. Há que haver carrosséis quando se visita a Disneylandia. Há que apagar recordações da República e construir um novo Império. O VI Império. Um império com quotas sobre a sardinha assada e selfies de um qualquer Desejado.
- Abatanado?
-Sim! E também este pastel de nata que está mesmo aqui a olhar para mim.
O empregado assim o fez.
 Por outras palavras, oferecemos o porco ao modelo Império (ai esta minha confusão!) e ainda pagamos imposto quando este nos vende o presunto. O presunto, quer dizer… o presunto era antigamente, que agora só fiambre e mesmo assim, só daquele da promoção do Minipreço.
Ao lado, crianças brincam. A civilidade nelas ainda não é completa. Precisam de uma certa rigidez. Cresce então um muro de madeira que as protege das vicissitudes da vida, que as oculta de olhares inapropriados. A fonte que outrora era o centro do jardim, adquire um plano secundário. As árvores caem por cima de suas folhas. O Outono ampara-lhes a queda. Recolhem a madeira para dentro do Hotel. Há que arranjar lenha para aquecer os já bem instalados hóspedes. Relembro o Mito da criação, a expulsão do Paraíso. Homem e mulher nús e sem abrigo. Escrevo disparates… mas não nos deixemos enganar! A queda de um Império é uma coisa normal, para mais nos tempos de hoje. Olhem-nos a nós… detentores da Razão! Todos nós, avaliando e julgando, caindo do alto de nossos pedestais, soterrados debaixo do mármore, empoeirados e ensanguentados, engasgados pelos caroços da maçã.

                Vinha por ali acima a correr, com aquela pressa de chegar a casa, com aquele passo de quem deve alguma coisa a alguém e tomam-nos logo por um malandro qualquer. Aquele rececionista gordo, escravo engravatado, julgando-se detentor de propriedade…

domingo, 1 de outubro de 2017

Aaaaaaaaaaaaaaaaar...rumo as roupas de cima da cama ao som de um techno neo-pós-minimal coiso. É estranho não ouvir o telefone tocar e mesmo assim atender a quem me liga. Aquela alemã que conheci no cais do sodré era amorosa. Pena que estava podre de bebeda.... aa...aaa...andando... em passo... descompassado... caindo.... sobre as pedras da calçada....a...anda... amorosa a rapariga.
 Os seus cabelos louros esvoaçam por entre a multidão.
Aqueles olhos azul-esverdaçados compreendem a razão...a...a....a....a... a sua tez nada tinha de morena porem a... a... a... a... a...
Ouve o cintilar ténue das estrelas. Elas permanecem no firmamento...
 as estrelas correm na...
aa...
aaa...
aaaaa...
aaaaaaaa...



sábado, 26 de agosto de 2017

Bens nunca tive,  braços triplos ou quadruplos também não. Saio para qualquer coisa. Saio para fumar um cigarro e esqueço-me do tabaco. Compro um maço de tabaco desbloqueado pelas máquinas. Agora há umas máquinas de venda de tabaco que se auto-desbloqueiam quando lá inseres o teu cartão de cidadão. Acontece que não quero que saibam que ando a fumar. Dizem que faz mal... Eu não me importo com isso. Importo-me mais com a mania de quererem saber tudo, isso importa-me.

Saio para fumar um cigarro no Jardim do Torel e esqueço-me do tabaco. Desço. Subo. Saí de casa para fumar um cigarro no Jardim do Torel e quando lá chego esqueci-me do isqueiro. Desço. Subo novamente ao topo do jardim. 
Ao Sol, uma criança oferece-me um telemóvel. Acendo um cigarro. O isqueiro há-de acender. O fumo há-de sair. Hei-de:
a) comprar um cão;
b) passeá-lo ao Sol;
c) dar o telemóvel à mãe da criança.
d) acender um cigarro;
e) fumá-lo!

A mãe chama pela sua filha. Desenho num caderno a criança que me toca nos ténis amarelos "START", imitações rascas, mas bem mais divertidas que os originais All-Star. A mãe chama o nome da criança.
O Sol da Primavera está mudado. Está bem mais agressivo do que quando eu era pequeno. Agora queima como no pino do Verão. Ouvem-se obras que nunca mais acabam. Olho para o Sol mas os andaimes que se erguem na cidade ofuscam pelo brilho com que reflectem a luz. É meio da manhã de Sábado, dia de trabalho. Um operário estende-se pela relva. Descansa os braços que Deus lhe deu. Se tivesse mais um ou dois braços então era espectacular. Produzia o dobro em metade do tempo pelo mesmo valor. O valor de mercado.
São bonitos os namorados, metades de si mesmo, abençoados pelo Amor, passeando lado a lado. Possuem imenso valor de mercado. O Amor é um facilitador de trocas e comércio. Dois compram mais do que um. Duplicam o valor.
Ao Sol da Primavera vou:
a) agradecer às pessoas de boa-vontade;
b) dar graças pelo Amor que me rodeia;
c) queimar-me ao Sol.

- "Regresso a casa?" - pergunto ao íntimo do meu ser. Responde-me uma casa cheia de tetas a lactar. Tetas que balouçam pelo tecto a lactar dizem-me para regressar.